As
considerações de Dom Orlando Brandes que hoje transcrevemos são oportunas não
só para o dia em que comemoramos as almas do purgatório. São oportunas para
todos os dias:
O Dia 2 de novembro é um dia marcante, porque é a festa da
imortalidade e da ressurreição. É uma recordação da vida de quem já peregrinou
neste mundo e agora alcançou a plenitude de seus desejos e esperanças. Aqui
somos companheiros de viagem, lá seremos convidados das núpcias do Cordeiro. A
melhor despedida é esta: “até nos revermos no céu”.
Não é fácil meditar sobre a morte, pois, estamos diante de um
mistério. Experimentamos a mortalidade do corpo e a imortalidade da alma.
Estamos cada vez mais despreparados para morrer. Mesmo sendo um fenômeno
universal e uma experiência existencial, não é fácil reconciliar-se com a
verdade da morte. É forte nosso instinto de conservação, nosso desejo de viver
mesmo sabendo que vamos morrer. “Só não morrem as flores de plástico” (T. S.
Eliot).
A morte hoje é um tabu, algo que escondemos, camuflamos,
afastamos como se fosse algo proibido e perigoso. Poucos morrem em casa, o luto
saiu da moda, afastamos as crianças do enterro, os profissionais da saúde são os
que assistem os moribundos.
A humanidade tomou duas posições diante da morte. A primeira
atitude é render-se ao nada, ao vazio, ao absurdo. A segunda opção é a crença
na reencarnação. Todavia há uma terceira via que não é filosófica, mas,
teológica. É a fé na ressurreição de Jesus Cristo e de todos os filhos de Deus.
A morte foi redimida, Jesus morrendo “matou a morte.”
Eis o que escreve Paulo apóstolo: “Semeado corruptível, o corpo
ressuscita incorruptível; semeado desprezível, ressuscita glorioso; semeado na
fraqueza, ressuscita cheio de força; semeado corpo animal ressuscita corpo
espiritual” (Cf. I Cor – 15,42-44).
A morte, na fé cristã, é uma experiência pessoal, uma passagem,
um parto e uma porta para uma nova fase da vida. “Meu fim é o meu início” (A.
Grünn). A vida não é tirada, mas é transformada. Felicidade, luz, paz,
plenitude, alegria, glorificação, constituem a realidade da vida após a morte,
na comunhão dos santos e na visão de Deus face a face. Ao morrer somos
abraçados pelo Pai, entronizados na comunhão dos santos, coroados pela
Santíssima Trindade, glorificados com Jesus, enriquecidos com a herança da
salvação.
Os santos e pessoas de fé atestam: “O dia da minha morte, será o
dia mais glorioso da minha vida”. Lembremos de Santa Terezinha que dizia: ” Não
morro, entro na vida”. Belíssimo testemunho de fé é o de Madre Leônia que
dizia: “Minha morte será um feliz pôr de sol”.
Para Jesus, a morte foi o retorno ao Pai, a entrega amorosa de
si, o supremo ato de amor, a hora da glorificação. Conheci um padre que
carregava na pulseira do relógio, esta frase: ” A morte é certa, a hora é
incerta”. Morrer para viver.
Nosso viver é também um caminhar para o morrer. Como uma mulher
grávida se prepara para o parto, como a gente se prepara para uma festa ou a
chegada de uma visita, assim, precisamos nos preparar para a nossa hora
derradeira. É assim que rezamos na Ave Maria: “agora e na hora de nossa morte,
rogai por nós”.
O céu é nossa pátria e paraíso. Lá somos esperados e nos
uniremos aos amigos, aos parentes, aos antepassados na comunhão dos santos. Diz
Santo Agostinho: ” caminha e canta, ama, corre, suspira pela pátria. Lá não há
inimigo, não morre o amigo, as lágrimas serão enxugadas, estaremos felizes e
tranquilos na visão, na beatitude, na pátria”. Lembremo-nos que aqui somos
peregrinos e que o melhor nos espera. O que nossos mortos são hoje, nós seremos
amanhã. “Quero morrer para estar com Cristo”, dizia Paulo Apóstolo. Sabemos
pela fé que o amor, o bem, as boas obras, não passam, mas nos acompanharão,
serão a chave da porta do céu, o passaporte para a glória. Os justos como
estrelas brilharão. Não precisaremos da luz do sol nem da lâmpada, pois, Deus
mesmo será a luz, será tudo em todos. A ordem é esta: “entra na alegria do teu
Senhor”. (Cf. Mt 25, 23).
Por
Dom Orlando Brandes – Arcebispo de Londrina (PR), via Gaudium Press
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